A inclusão ainda não está na moda 

Inês Faria
Especialista de Conhecimento e Formação no BCSD Portugal

A moda sempre foi um espelho da sociedade, uma forma de expressão e comunicação pessoal, mesmo que essa comunicação seja um “não quero saber” e um “vesti uma coisa qualquer”. Desde os movimentos culturais que definiram estilos icónicos até à forma como as marcas comunicam com os seus consumidores, a indústria reflete e influencia os valores do seu tempo. Hoje, a diversidade, a equidade e a inclusão tornaram-se temas centrais no discurso da moda – e principalmente na imagem de moda. Mas será que esta mudança está a ir além das campanhas publicitárias e uma ocasional coleção cápsula, tornando-se uma verdadeira transformação estrutural? 

Quando era criança achava a moda um mundo apaixonante, lembro-me de pensar que era um sentimento que devia ser comum a todos, porque mesmo a pessoa com o menor dos interesses teria de andar vestida. Entretanto, tendo crescido numa família com um avô com deficiência, ganhei outra visão sobre o tema: comecei a descobrir que embora a roupa fosse um produto universal, não estava preparada e não era feita à medida de toda a gente. Claro que todos já pensámos que alguma peça de roupa não era adequada para o nosso corpo; não me lembro de ter comprado alguma vez umas calças que não fossem demasiado compridas e não precisassem de subir a bainha: um problema bem fácil de resolver, na verdade, embora já nos dê algumas pistas de que a moda não é pensada para todos. 

Mas não é bem esse o tópico aqui, refiro-me a algo mais estrutural e mais profundo. Quando pensamos numa pessoa que se desloca numa cadeira de rodas, tal como o meu avô, imaginamos alguém que tem uma série de movimentos limitados e que passa grande parte do dia sentado. E o que é que isso interfere com o vestir, despir e estar vestido? Vestidos e calças largas correm o risco de ficarem presos nas rodas das cadeiras; camisas e camisolas compridas ficam com tecido acumulado na zona da barriga; quando sentados, a cintura das calças desce. Estes são apenas alguns desafios que uma pessoa que se desloca em cadeira de rodas pode enfrentar no que toca ao seu vestuário e ao conforto daquilo que é a sua segunda pele e a tela com que se apresenta ao mundo. 

Outras condições específicas terão certamente desafios distintos e, portanto, outras necessidades específicas. Para pessoas com limitações na motricidade fina pode-se substituir os botões por molas de pressão ou peças magnéticas. Para pessoas com hipersensibilidade, é necessário pensar em estratégias e técnicas que mantenham a conformidade legal, eliminando a etiqueta interior (que é extremamente necessária embora a nossa primeira ação após a compra seja, muitas vezes, cortá-la). Estas e outras estratégias podem ser aplicadas no vestuário, tornando-o mais acessíveis a todos – como mangas mais largas nos blazers para facilitar o vestir – ou a um grupo específico – como os códigos de cores para pessoas daltónicas. “É um nicho”, podem pensar, mas um código de cores numa peça de roupa ou molas de pressão em vez de botões não me faz diferença e pode fazê-lo para outra pessoa. 

Fala-se muito, e cada vez mais, sobre sustentabilidade na indústria têxtil e vestuário, principalmente olhando pela lente ambiental, e este tema tem ficado para trás. Para as coleções de moda da próxima estação, espero que a tendência seja diversidade, equidade e inclusão e que todos se possam expressar; mesmo que seja para mostrar que só “vestem uma coisa qualquer”. 

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