Os desafios sociais são os mais complexos por sermos hoje no planeta quase oito mil milhões de pessoas e cada uma ter a expetativa (legítima) de viver uma vida longa, saudável, confortável e com acesso a oportunidades. Naturalmente, nos países em desenvolvimento os desafios sociais mais prementes serão mais elementares – por exemplo, o combate à pobreza –; já nos países desenvolvidos, aspetos como a habitação ou a promoção da diversidade e da igualdade – de género, cultural ou de orientação sexual – são preocupações mais comuns nas prioridades públicas e das empresas.
A Europa, apesar de vários fenómenos históricos de barbárie, tem sido um continente de tradição humanista. Desde a Segunda Guerra Mundial, nos países da União Europeia, normas e diretrizes comuns, bem como o acesso a fundos de coesão, têm sido um garante de que as pessoas ocupam o centro do debate e das prioridades políticas. Já este século, Portugal deu contributos relevantes para o denominado Pilar Europeu dos Direitos Sociais, nomeadamente, através da Estratégia de Lisboa (2000) e do Compromisso Social do Porto (2021).
Os temas sociais são desafiantes pela sua escala, mas também pelo seu carácter complexo, dinâmico e algo imprevisível. A recente tendência inflacionista a que a pandemia Covid-19 e, sobretudo, a guerra na Ucrânia deram origem – na Europa e no mundo – agravou fenómenos de pobreza e exclusão. A inflação mundial já não era tão elevada desde 1981. Em Portugal, já atingiu os 8,2% (0,9% em 2021). Da energia à alimentação, tem sido galopante a subida dos preços. Em alguns bens, essa tendência até já vinha de trás – é o caso do acesso a habitação nos grandes centros urbanos, cada vez mais condicionado pela subida ao longo de anos do valor das rendas e dos preços, devido a fenómenos como o short rental e o investimento estrangeiro. A título de exemplo, Alfama tinha 20 mil habitantes na década de 1980; hoje, tem menos de mil e 70% do seu parque habitacional está afeto a short rental, sendo a renda média atual de longa duração mil euros – valor que contrasta com o valores do salários mínimo (705 euros) e médio (1.361 euros) nacionais.
Em Portugal, na UE ou em qualquer parte do mundo, sem as pessoas nunca teremos um modelo de desenvolvimento sustentável. Certo dessa premissa, o think tank “Friends of Europe” apela a um novo contrato social e a que as crises com que nos vamos confrontando não nos distraiam ou adiem objetivos importantes de longo prazo. Para esta década, temos o Pacto Ecológico Europeu, o Acordo de Paris sobre o clima e os 17 Objetivos de Desenvolvimento da Agenda 2030 das Nações Unidas. Sermos bem-sucedidos a alcançar as suas metas só depende de nós, isto é, das pessoas, dos seus comportamentos e atitudes. Em síntese, ou a transição é justa, inclusiva e apoiada, ou simplesmente não acontecerá.
João Meneses, Secretário-Geral do BCSD Portugal